EXPLICAÇÕES

 Portugal poderá vir a confrontar-se, com elevada probabilidade, com a subida da inflação, a esmagar ainda mais os já magros rendimentos médios da população. O banco central europeu poderá fazer um aperto na sua política monetária. O BCE tem vindo a manter baixas taxas de juro e a comprar boa parte da dívida de países como Portugal. Vive-se um cenário em que a pandemia ainda tem um rumo imprevisível, as mercadorias estão paradas nos cais à espera de contentores disponíveis, o custo de transporte dispara para níveis insuspeitáveis e a oferta não dá resposta, com todos estes entorses na cadeia de valor, a uma procura global que, mesmo assim, cai no mercado tradicional, físico, e estabiliza no digital. Ao mesmo tempo, os mercados continuam em mudança acelerada, com a Inteligência Artificial (IA) a suscitar saltos incríveis nos processos de produção e a deixar no ar riscos seríssimos, debatidas em livro por figuras tão relevantes como Henri Kissinger, Eric Schmidt e Daniel Hutettenlocher - Schmidt foi CEO da Google e Hutettenlocher é do MIT. A IA põe em causa o primado da racionalidade humana.

Não só no quadro mundial paira a incerteza e a rápida transformação como o quadro europeu muda. A Alemanha, a principal economia e o principal recurso europeu, não irá deixar de fazer o que for necessário para manter o euro, mas aumentará a fidelidade ao horror à inflação e a políticas monetárias mais acomodatícias. O ministério das Finanças alemão foi, com a nova coligação que reúne sociais-democratas, verdes e liberais, confiado aos liberais e sabe-se o que eles pensam quanto à dívida e à sistemática subsidiação dos países mais pobres. Do ponto de vista português é de prever, mais tarde ou mais cedo, uma deterioração das condições de financiamento da dívida, problemas do lado dos mercados externos, a difícil recuperação do mercado do turismo e da restauração no meio de uma pandemia que parece não ter fim.

Além dos apoios generosos, a fundo perdido, que agora recebe de Bruxelas (o PRR, com um prazo de execução muito curto), acrescidos da verbas do programa comunitário de apoio, Portugal tem que habituar-se a andar pelos próprios pés, pois os dinheiros de Bruxelas, numa união monetária em que a Alemanha impera, virão em muito menor quantidade e maiores exigências quanto a reformas que vão ficando por fazer. Fica-se com a sensação de que o actual primeiro-ministro, António Costa, definiu como programa o que "não podia fazer" e não o que tinha a fazer. Conseguiu viabilizar orçamentos até os comunistas lhe pedirem coisas, em matéria da legislação laboral, incompatíveis com os compromissos firmados com Bruxelas, condição para obter o tal «cheque» assinado. Rui Rio, o "challenger" de Costa, confirmado, contra a opinião sustentada na comunicação social, à frente dos sociais-democratas (PSD), fez um discurso de vitória que toca nas principais preocupações dos portugueses: quer atacar os salários baixos, reabilitar um SNS que está de rastos, quer menos endividamento, melhores serviços públicos, menos interesses instalados. Todos queremos. Terá de explicar no programa eleitoral e na próxima campanha como o irá fazer, quais as prioridades, qual a calendarização. Ao incumbente, António Costa, caberá explicar o mesmo. E Ventura e Cotrim de Figueiredo não ficam de fora das explicações a serem dadas aos eleitores portugueses. Talvez tenham mesmo a percepção, cada um deles, que nisso pode estar o seu sucesso ou insucesso.

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