Os Muros e Costa

Para os comunistas portugueses a queda do Muro de Berlim, que epigrafou a queda do comunismo soviético, tem uma ressonância "trágica". Confessam-no abertamente no seu longo e precioso (pelos saborosos atavismos que encerra) programa político.  «A luta pelo socialismo no mundo sofreu ao findar o século XX derrotas de trágicas consequências para a luta dos trabalhadores e dos povos contra todas as formas de exploração e opressão, com a desintegração da URSS e dos regimes existentes nos países do Leste da Europa», lê-se no programa do Partido Comunista. Os comunistas portugueses identificam 'os desvios' que conduziram ao monumental desaire histórico (o excessos centralistas, a burocracia, o autoritarismo, o "centralismo burocrático"), mas mantêm-se fieis a uma análise clássica, onde as relações de produção bloqueiam o desenvolvimento das força produtivas (sic, é o que lá se lê). O horizonte para as sociedades e para a espécie humana continua igual: uma sociedade comunista, onde não se chega apenas através do palco parlamentar. Os comunistas permanecem religiosamente fieis aos princípios e objectivos da revolução de 1917. São uma relíquia política. E, a eles, dói-lhes o derrube de muros.

Ora, o derrube de um muro, que colocava em Portugal a esquerda do PC do lado oposto ao da governação, foi o festejado pelo primeiro-ministro que fez a opção política de se aliar aos partidos à sua esquerda para chegar ao poder. Um apoio que, após a maioria relativa obtida pelos socialistas nas últimas eleições (um relativo malogro, pois esperavam já então alcançar a maioria absoluta), ficou reduzido a um entendimento entre eles e os comunistas a propósito do Orçamento de Estado. E que falhou. Falhou porque António Costa se enganou-se ou quis enganar-se: é que o Muro de Berlim foi derrubado para pôr fim ao comunismo, não para reabilitá-lo. 

É que os comunistas estarem-se marimbando para cumprir os compromissos estabelecidos com a União Europeia, é algo perfeitamente natural dada a sua posição declaradamente anti-UE e é apenas um pormenor num erro gigantesco de orientação política. Um erro que supostamente teria um custo eleitoral muito elevado. Mas possivelmente não vai ter.

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